Instabilidade nos Bálcãs: a crise constitucional na Bósnia
- Thiago Palomino de Bem
- 4 de mai.
- 3 min de leitura

Sabe-se que os Bálcãs são uma espécie de "barril de pólvora" da Europa. A região destaca-se por sua complexidade cultural, histórica e religiosa, além de ser uma área de intersecção entre Oriente e Ocidente, Império Otomano e Austro-Húngaro. Em grande parte de sua história, os Bálcãs estiveram sob a sombra de grandes impérios, sendo que sua autodeterminação é um fenômeno recente. Um exemplo da volatilidade da região é a eclosão da Primeira Guerra Mundial. Este conflito teve início em Sarajevo, com o assassinato de Francisco Ferdinando, herdeiro do Império Austro-Húngaro, por um estudante bósnio membro da organização nacionalista sérvia "Mão Negra" em 1914. As potências que circundavam a região exerceram intensa influência nas estruturas de poder dos países que hoje formam os Bálcãs, criando barreiras culturais no inconsciente dos povos, utilizadas por líderes como Tito para unificação ou por Milošević para separação xenofóbica.
Nos anos 1990, as Guerras Balcânicas foram marcadas por discursos de ódio, crimes contra a humanidade, limpeza étnica, estupros sistemáticos e genocídios. A Guerra da Bósnia, especificamente, foi a mais sangrenta em solo europeu desde a Segunda Guerra Mundial, catalisando a criação de um Tribunal Penal Internacional específico para julgar o caso. Essas guerras emergiram em um contexto regional e internacional crítico. Após a morte do General Tito em 1980, houve um vácuo de poder, pois ele não indicou um sucessor político. Neste cenário, o político sérvio Slobodan Milošević ganhou notoriedade. A crise econômica causada pelos choques do petróleo, a indignação da Eslovênia e Croácia pelas ações autoritárias da Sérvia no Kosovo, e a desigualdade nas contribuições econômicas dessas repúblicas para o governo central, aumentaram as tensões, culminando nas guerras. A instabilidade coloriu a região, tornando indispensável uma análise cuidadosa e atenta dos Bálcãs.

Após os Acordos de Dayton, em 1995, o governo da Bósnia foi estruturado para ser rotativo, envolvendo as três principais etnias do Estado: os bósnio-muçulmanos, os bósnio-sérvios e os bósnio-croatas. Os acordos que marcaram o fim da guerra definiram que o Estado seria dividido em duas entidades: a Federação da Bósnia e Herzegovina (de maioria bósnia-muçulmana e bósnio-croata) e a República de Srpska (de maioria sérvia). Dayton estabeleceu uma nova constituição e a implementação de um Alto Representante pela ONU, responsável por garantir a implementação civil dos Acordos, governança, estabilidade e reconciliação na Bósnia. O Alto Representante tem autoridade para impor leis, destituir autoridades locais e intervir em processos legislativos que ameacem a paz, os conhecidos "Bonn Powers". A existência deste Alto Representante até os dias atuais reflete impasses étnicos persistentes que ameaçam a paz, mantendo a região em constante insegurança. Entretanto, essa figura é duramente criticada por políticos locais, como os líderes sérvios da República de Srpska.
Desde o início de janeiro de 2025, a Bósnia tem vivido seus momentos mais tensos desde a Guerra de 1992-1995, com o Alto Representante para a Bósnia, Christian Schmidt, sendo publicamente desafiado pelo líder da República de Srpska, Milorad Dodik. Dodik foi condenado a um ano de prisão e seis anos de reclusão da política por um tribunal bósnio, após desafiar as ordens de Schmidt. Ele se recusou a participar do julgamento e afirmou que Bósnia e Herzegovina não existem mais. Além disso, o Alto Representante anunciou um corte do fundo eleitoral para o partido de Dodik. As tensões escalavam enquanto a polícia bósnia tentou, sem sucesso, prender Dodik.
Em resumo, os Bálcãs devem ser observados com rigorosa atenção, dada sua história conturbada e os eventos recentes. As diferenças étnicas já levaram a conflitos terríveis nos anos 1990. Espera-se que as tensões atuais não culminem em outro conflito. A população da Bósnia, multicultural, exige um governo firme que impeça discursos de ódio de ganharem força novamente. No entanto, a administração central permanece fraca e suscetível a falhas institucionais.
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Referências das imagens:
Wikimedia Commons contributors. 2009. "File:DaytonAgreement.jpg," Wikimedia Commons, the free media repositor. Disponível em https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/13/DaytonAgreement.jpg. Acessado em 04 de maio de 2025.
Wikimedia Commons contributors. 2018. "File:DC-1914-27-d-Sarajevo-cropped.jpg," Wikimedia Commons, the free media repositor. Disponível em https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/e/ea/DC-1914-27-d-Sarajevo-cropped.jpg. Acessado em 04 de maio de 2025.
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